segunda-feira, 14 de abril de 2014

Jogos Eternos - Brasil 4×1 Itália 1970

O Brasil massacra a seleção Italiana, Naquela que seria considerada a melhor Seleção de todos os tempos.


Data: 21 de junho de 1970
O que estava em jogo: o título da Copa do Mundo de 1970 e a posse definitiva da Taça Jules Rimet.
Local: Estádio Azteca, Cidade do México, México.
Juiz: Rudolf Glöckner (ALE)
Público: 107.412 pessoas

Os Times:

Brasil: Félix; Carlos Alberto Torres, Brito, Piazza e Everaldo; Clodoaldo, Gérson e Rivellino; Jairzinho, Tostão e Pelé. Técnico: Zagallo.

Itália: Albertosi; Burgnich, Rosato, Cera e Facchetti; Bertini (Juliano, 28´do 2º) e De Sisti; Domenghini, Boninsegna (Rivera, 38´do 2º), Mazzola e Riva. Técnico: Ferruccio Valcareggi.

Placar: Brasil 4×1 Itália (Gols: Pelé-BRA, aos 18′,e Boninsegna-ITA, aos 37´do 1º T; Gérson-BRA, aos 21´, Jairzinho-BRA, aos 24´, e Carlos Alberto-BRA, aos 41´do 2º T).



Jairzinho em ação contra o Peru: craque brasileiro marcou gol em todos os jogos da Copa.

“A apoteose da melhor seleção da história”

Depois de passar pelas mãos de capitães de cinco países, resistir a uma II Guerra Mundial, e manter-se intacta por 40 anos, a Taça Jules Rimet ganharia um dono único e eterno ao término do jogo final da Copa do Mundo de 1970, realizado no estádio Azteca, no México, em 21 de junho de 1970. E a seleção guardiã do objeto de 4 kg, sendo 1,8 kg de ouro puro, não poderia ser uma qualquer. Pelo contrário. Ela deveria reunir a mais nobre classe futebolística, total desenvoltura para virar jogos, golear adversários e, claro, já ter vencido duas Copas do Mundo anteriormente. Após 231 jogos em nove países distintos, duas seleções se perfilaram no gramado mexicano com chances de levar a taça para casa: Itália, campeã em 1934 e 1938, e Brasil, campeão em 1958 e 1962. 

Não bastasse a final de 1970 decidir uma Copa, ela decidiria o destino final do troféu. Muitos pensavam que seria o “jogo do século”, embora dias antes ele já tivesse sido disputado, naquela mesma Copa, por italianos e alemães. Muitos também pensavam que haveria equilíbrio, que em Mundiais tudo poderia acontecer e outras velhas máximas. Porém, o que se viu naquele 21 de junho de 1970 foi uma apresentação única, mágica e irresistível. Temperada pelo sol límpido do verão mexicano, a Seleção Brasileira de futebol protagonizou a melhor final da história das Copas. A final dos golaços. A final dos lances soberbos. A final dos toques de classe. A final da dominância absoluta no segundo tempo. A final do gol coletivo mais plástico e lindo que uma Copa já viu. E a final do tricampeonato do time verde, amarelo e azul. 

De Carlos Alberto. De Piazza. De Gérson. De Jairzinho. De Rivellino. De Tostão. E de Pelé. Ah, Pelé, aquele que levitou mais alto do que qualquer ser humano normal e marcou o centésimo gol brasileiro em Copas exatamente naquela final. E que deu o passe perfeito para o chute perfeito no gol perfeito de Carlos Alberto, o que fechou a goleada improvável de 4 a 1 contra um adversário que jamais soube levar mais de dois ou três gols num só jogo, mas sim evitá-los. A Itália era ótima. Mas o Brasil era estupendo. Perfeito. Único. É hora de relembrar a apoteose da melhor seleção de todos os tempos.



Itália e Brasil perfilados fariam aquela que seria uma das mais inesquecíveis Finais em Copas do Mundo.

Muito antes de a Copa do Mundo de 1970 começar, ela já era aclamada como a mais promissora de todas. E as perspectivas se confirmaram quando a bola rolou. As equipes que viajaram ao México levaram craques do mais alto escalão e transformaram o Mundial em um show de estrelas. A Alemanha de Sepp Maier, Beckenbauer e Gerd Müller, a Inglaterra de Gordon Banks, Bobby Moore e Bobby Charlton, o Uruguai de Mazurkiewicz, Ancheta e Cubilla, e o Peru de Chumpitaz, Sotil e Cubillas, foram só algumas das equipes que se juntaram a Brasil e Itália e fizeram do torneio mexicano único. Após jogos memoráveis, Brasil e Itália superaram adversidades, fantasmas e o calor para fazerem a decisão perfeita de uma Copa perfeita. Aliás, uma decisão dupla, pois o campeão ganharia a posse definitiva da Taça Jules Rimet, que seria de posse do país que a vencesse três vezes. No entanto, as duas equipes chegaram ao duelo em condições distintas.

A vitória do Uruguai sobre o Brasil, em 1950, e da Alemanha sobre a favoritíssima Hungria, em 1954, serviam como exemplos para comprovar que nenhuma equipe poderia ser considerada campeã antes do apito final. Embora houvesse respeito em ambos os lados, o Brasil levava o favoritismo e uma grande festa antecipada já tomava conta das ruas do Rio de Janeiro, de São Paulo, de Salvador e de várias outras cidades. A promessa era de um jogo marcante, repleto de grandes lances e, talvez, poucos gols, graças à fama italiana de defensivismo.



Itália e Alemanha fizeram um duelo sensacional na semifinal de 1970.

O Brasil vinha de uma vitória que lavou a alma do torcedor canarinho: (3x1), sobre o Uruguai, no primeiro encontro entre os dois países desde a fatídica final de 1950, vencida pela Celeste. Antes disso, a equipe do técnico Zagallo destroçou fortes rivais sempre exibindo um futebol vistoso, cheio de brilho e com um ataque devastador formado por jogadores que vestiam a camisa 10 em seus clubes: Rivellino, Jairzinho, Tostão e Pelé. O quarteto, muito bem amparado por Félix, Brito, Piazza, Carlos Alberto, Everaldo, Clodoaldo e Gérson, ajudou o Brasil a marcar 15 gols em apenas cinco jogos. Além disso, aquela seleção esbanjava preparo físico e parecia nem sentir os efeitos que o calor do meio-dia causava aos atletas das outras equipes – principalmente as europeias. Falando nelas, a Itália foi uma das que sentiu de maneira mais intensa os efeitos do calor – e de uma partida épica. 

Após uma primeira fase morna, a Azzurra goleou o anfitrião México e foi embalada para a semifinal, contra a Alemanha. A equipe vencia por (1x0) até os minutos finais quando os alemães “acharam” um gol de empate e levaram o duelo para a prorrogação. Nela, cinco gols marcados, viradas impossíveis e altas doses de dramaticidade fizeram da vitória azul por (4x3) o mais espetacular jogo da história das Copa. No entanto, aquela vitória custou caro ao time de Ferruccio Valcareggi. Os atletas da Itália jogaram 120 minutos intensos e tiveram apenas quatro dias para se recuperar até a decisão contra o Brasil, que estava muito mais inteiro. Se na bola o time europeu já não podia se equiparar aos sul-americanos, com o cansaço ele seria ainda mais frágil. Mas, se tratando de Copas, tudo poderia acontecer, como bem diziam os jornalistas e comentaristas da época.



Pelé o monstro sagrado do futebol marca o 100º Gol do Brasil em Copas do Mundo.

A Itália até deu alguns sustos no começo do jogo com bolas alçadas na área e a presença do estupendo Luigi Riva, mas foi o Brasil que dominou as ações e evitou um gol que colocaria a Azzurra toda no campo de defesa. Aos 18´, Tostão cobrou lateral para Rivellino, e este cruzou do jeito que deu para a grande área da Itália. Burgnich, defensor italiano, foi recuando, certo de que não havia ninguém por perto e que não precisaria saltar tanto para dominar a bola. Mas, logo atrás dele, estava Pelé, que saltou 30 cm mais que Burgnich para cabecear no canto esquerdo do goleiro Albertosi. Gol! Era mais do que um gol. Era o 100º gol do Brasil em Copas do Mundo. E na melhor ocasião possível.

A torcida mexicana explodiu e o gol forçou a Itália a sair de sua defesa e buscar o empate. Embora estivesse à frente do placar, o Brasil demonstrava certo nervosismo, não criava tantas chances de gol e Jairzinho sofria com a marcação implacável de Facchetti. Astuta, a Itália esperava um único erro dos brasileiros para tentar o empate, e cercava os defensores Brito e Piazza a cada saída de bola. Após 20 minutos de domínio brasileiro, mas com poucas chances de gol, eis que surge a oportunidade que tanto os azuis pediam aos céus. Clodoaldo recebeu de Brito, no meio de campo, e decidiu dar de calcanhar, de primeira, para Everaldo. O pensamento era de classe, mas foi de pura imprudência. Boninsegna interceptou o toque do brasileiro e engatilhou aquilo que mais os italianos sabem fazer: contra-atacar. O atacante driblou Piazza, tirou Brito e Félix da jogada, e chutou da meia lua para empatar o jogo: (1x1). Ânimos esfriados do lado brasileiro. 

E esperança viva na Itália! Passava pela cabeça da turma europeia o filme da semifinal, do triunfo épico sobre a Alemanha e da possibilidade de uma vitória bem dramática, também, contra o Brasil. Já os sul-americanos temiam o pior quando Pelé teve um gol anulado pela arbitragem, aos 45 minutos, quando o árbitro alegou já ter apitado o fim do primeiro tempo antes da conclusão do Rei. Faltavam 45 minutos para o primeiro tricampeão mundial ser conhecido. E as apostas, antes pesando mais para o lado brasileiro, ganhavam toques de (momentânea) igualdade.



Gerson manda um Petardo e marca o 2º para o Brasil.

Embora o primeiro tempo tenha terminado bem amargo para os brasileiros, um dado estatístico e verídico trazia tranquilidade para muita gente no país sul-americano. Das cinco vitórias do time antes da final, três haviam sido na etapa complementar. Era o resultado da preparação antecipada e do excelente físico que aquele time ostentava mesmo diante de um calor escaldante pós-meio dia. Já os italianos sentiriam nos últimos 45 minutos da Copa de 1970 o cansaço provocado pela partida semifinal. 

Cada gota de suor valia por duas, e cada corrida em direção à linha de fundo guardaria um longo trajeto de volta ao campo de defesa. Nos primeiros minutos, houve certo equilíbrio com chances de Pelé e Gérson, para o Brasil, e Domenghini, para a Itália, que chutou no contrapé de Félix e quase marcou. Mas, depois de dezenove minutos iguais, o Brasil tratou de encerrar a decisão e fazer dela a sua apoteose do tricampeonato.



O Furacão Jairzinho faz história ao marcar o 3º para a Seleção Brasileira.

Aos 21´, Carlos Alberto lançou Gérson, e este deixou na esquerda. A bola sobrou para Jairzinho, que buscava uma brecha diante da marcação do capitão italiano Facchetti. O brasileiro foi desarmado, mas a bola ficou com Gérson, que passou por um, ajeitou para a perna esquerda e mandou um petardo de fora da área, no cantinho de Albertosi: golaço! A festa brasileira começava a aumentar na mesma proporção que o cansaço dos italianos, que precisavam de pelo menos mais um gol. Mas como fazer um gol e não levar nenhum de um time fantástico e na ponta dos cascos? Apenas três minutos depois, Gérson mostrou como se fazia um lançamento de 50 metros em direção a um companheiro. 

Tal lançamento, iniciado lá no meio de campo, foi de encontro a Pelé. Do jeito que a bola veio, o Rei só escorou de cabeça para Jairzinho, enfim, livre da marcação de Facchetti, tocar com a coxa na bola. Foi o suficiente para a redonda vencer Albertosi e ir entrando, mansinha, mansinha, em direção ao gol. Brasil 3×1 Itália. Era mais um gol do Furacão. E a prova de que a tal teoria de Valcareggi, a de “marcar Jairzinho e pronto”, era uma furada. Aquele Brasil não se marcava. Muito menos se parava com táticas ou ferrolhos. Aquilo era arte pura. Classe pura. Futebol puro. E ainda restavam vinte minutos.




Riva e sua famosa Patada Atômica...

Mesmo com Riva, Domenghini, Mazzola, Boninsegna e, depois, Rivera, a Itália não conseguia criar grandes chances de gol e via o Brasil gastar o tempo e fazer apenas ataques pontuais esperando o tempo passar. Com um toque de bola fascinante e um futebol extremamente moderno para a época, os brasileiros arrancavam “olés”, da torcida e mostravam a cada minuto que eram mesmo os melhores do planeta. Mas ainda faltava um Grand Finale, uma obra de arte daquelas que contagiam qualquer ser humano, que não deixa espaço para críticas e que vira sinônimo de algo bom. Aos 41´, o Brasil iniciou a jogada coletiva mais exuberante que uma Copa do Mundo já viu, e que teve participação direta ou indireta de praticamente metade dos atletas vestidos em verde e amarelo. Palavras não são suficientes para descrever tal maravilha, mas servem como ilustração do que aconteceu naquele momento.



Carlos Alberto recebe de Pelé e chuta para marcar um dos mais belos gols em Copas do Mundo.

Tostão, na esquerda, roubou a bola de um italiano e a deixou com Piazza. O zagueiro tocou para Clodoaldo, que olhou para frente e viu quatro jogadores vestidos de azul no seu caminho. O volante decidiu apagar o toque equivocado do primeiro tempo e quis se redimir com a torcida. Para isso, ele tocou para Pelé, e este para Gérson, até que a bola voltasse para Clodoaldo, que já tinha raciocinado o que iria fazer nos segundos seguintes. Com a bola de novo em seus pés, o camisa 5 driblou um, driblou dois, driblou três, driblou quatro e tocou na esquerda para Rivellino. Em seguida, Clodoaldo apontou para frente e deu a dica para o companheiro: “toca no Jair!”. Rivellino lançou o camisa 7 brasileiro, que foi para o mano a mano com Facchetti, jogador que ele não aguentava mais ver pela frente. Outra vez sem espaços, Jairzinho deixou com Pelé, pouco antes da meia lua. O camisa 10 poderia chutar, passar para Tostão ou devolver para Jairzinho. Mas ele não fez nada disso. Gênios não fazem ou pensam o previsível. Eles criam o inexistente, o impensável, o formidável. 




O Capita Carlos Alberto e Tostão nas redes comemoram o 4º Gol e massacre em cima da Azurra.

 Pelé recebeu e rolou a bola, para a direita, sem olhar. “Para quem ele tocou?”, pensaram os italianos. Para o capitão. O capita. Nada mais justo o homem que levantaria pela última vez a Taça Jules Rimet encerrar o baile canarinho no Azteca. Como um foguete, Carlos Alberto Torres apareceu totalmente livre e, sem ajeitar ou fazer qualquer frescura tão comum no futebol atual, chutou forte, seco, e de maneira indefensável para o gol: (4x1). GOLAÇO. Êxtase no México. Torcedores ensandecidos. Aplausos. Gritos. E total perdição dos italianos. Como podia tudo aquilo? De onde tinha saído aquele Brasil? Não havia explicação. Era um time sensacional.



Após o Apito Final, Italianos no chão e Brasileiros alucinados pela conquista definitiva pela taça Jules Rimet.

Nos minutos seguintes, a Itália ainda tentou marcar pelo menos mais um gol, mas já era tarde. Aos 45´, o árbitro alemão Rudolf Glockner apitou o fim do jogo. E o início de uma festa jamais vista na história das Copas. Milhares de torcedores invadiram o gramado para arrancar as peças de seus artistas (até mesmo o italiano Rosato, que pegou a camisa de Pelé e a leiloou décadas depois por mais de US$ 280 mil!). Tostão quase ficou nu. Rivellino desmaiou. Pelé ficou apenas de calção. E o Brasil se sagrou o primeiro tricampeão mundial de futebol. E o único detentor da Taça Jules Rimet. Carlos Alberto Torres a ergueu das tribunas de honra do estádio Azteca, que ficou pequenino diante da imponência dos artistas brasileiros, mágicos que transformaram a final da Copa do Mundo de 1970 em uma apoteose. Em um carnaval. Em um baile imortal.



O Capita levanta o tão cobiçado troféu. A Jules Rimet ficaria até então em definitivo com a Confederação Brasileira.

A trajetória e o brilho do time de 1970 jamais foram vistos novamente nas Copas seguintes. Várias seleções brilharam, claro, mas nenhuma teve a intensidade, a força e o ímpeto que o time de Carlos Alberto, Clodoaldo, Gérson, Tostão, Jairzinho, Rivellino e Pelé. Sem grandes atuações nas Copas de 1974 e 1978, o Brasil voltou a montar uma seleção estupenda no Mundial de 1982, e deu pinta de que seria tetracampeão com novas doses de arte e magia. No entanto, um adversário que antes trazia alegrias se transformou em fantasma: a Itália. Com um Paolo Rossi inspirado, a Azzurra fez (3x2) no time canarinho e enterrou para sempre o último esquadrão brasileiro que jogou o futebol arte.

Para aumentar ainda mais a fase negra do Brasil, um ano depois, a Taça Jules Rimet foi roubada da sede da CBF, no Rio. Os ladrões a derreteram e acabaram com a aura do troféu conquistado no México, em 1970. Sensibilizada pelo fato, a FIFA presenteou o Brasil com uma réplica idêntica, que segue intacta até hoje. No entanto, aquela velhinha dourada erguida por Carlos Alberto não existe mais. Como não existe mais a arte no futebol brasileiro.



O Rei é carregado pelos mortais que só podiam admirar a sua realeza e agora único Tricampeão do Mundo.

Pelé: A Final da Copa do Mundo de 1970, serviu para consolidar Pelé como o maior jogador de todos os tempos. Embora para alguns mais tarde o compararia com o genial Maradona, mais nenhum jogador até hoje ganhou 3 Copas do Mundo, sendo a primeira com apenas 17 anos anotando 6 gols na Copa de 1958. Além disso, Pelé marcou ao longo de sua carreira gloriosa 1283 Gols, parou uma Guerra e imortalizou sua camisa 10 do Santos FC e Seleção Brasileira. Quando se falar em futebol, um só rei aparece como imortal, os outros porém podem ostentar uma coroa no reino dos mortais do futebol.
(Texto: Marcelo H. Zacarelli)

Itália: a derrota de goleada na final de 1970 doeu muito no orgulho dos italianos, mas foi consenso geral que o Brasil era mesmo muito superior. Nos anos seguintes, a equipe perdeu a força que demonstrou no final dos anos 60 e só foi dar a volta por cima em 1982, na Copa do Mundo da Espanha. Em terras calientes como as mexicanas, o time azul superou escândalos de manipulação de resultados e a total desconfiança para vencer grandes titãs a partir da segunda fase e faturar o tricampeonato. No caminho, a Itália reencontrou um novo Brasil artístico, mas não deu chances para uma nova goleada: Paolo Rossi marcou três gols e deu a vitória épica aos italianos, por (3x2). Ao contrário de 1970, a Itália de 1982 não marcou apenas um homem do Brasil. Ela marcou todos. E venceu.

(Fontes do Site Imortais do Futebol)

domingo, 13 de abril de 2014

Jogos Eternos – Argentina 2×1 Inglaterra 1986

A Rivalidade contra os Ingleses e a Genialidade de Maradona.


Maradona foi o Protagonista de uma Argentina incontestável em seu Bicampeonato Mundial.

Data: 22 de junho de 1986
O que estava em jogo: uma vaga na semifinal da Copa do Mundo da FIFA de 1986.
Local: Estádio Azteca, Cidade do México, México.
Juiz: Ali Bennaceur (TUN)
Público: 114.580 pessoas

Os Times:

Argentina: Pumpido; Cuciuffo, Brown, Ruggeri e Olarticoechea; Batista, Giusti, Enrique e Burruchaga (Tapia 30´do 2º T); Maradona e Valando. Técnico: Carlos Bilardo.

Inglaterra: Shilton; Stevens, Butcher, Sansom e Reid (Waddle 19´do 2º T); Fenwick, Steven (Barnes 29´do 2o T) e Hoddle; Hodge, Lineker e Beardsley . Técnico: Bobby Robson.

Placar: Argentina 2×1 Inglaterra (Gols: Maradona-ARG, aos 6´ e aos 10´, Lineker-ING, aos 36´do 2º T).



No futebol, a rixa começou em 1966 após um conturbado duelo entre os dois países na Copa daquele ano.

Não bastasse a rivalidade histórica entre argentinos e ingleses existir por causa das Malvinas, a rixa entre ambos também era visível no futebol desde 1966, na Copa do Mundo realizada na terra da Rainha. Naquele ano, as duas seleções se enfrentaram num duelo quente pelas quartas de final que terminou com várias faltas duras e a polêmica expulsão do argentino Rattín, que cansou os ouvidos do árbitro alemão Rudolf Kreitlein com palavrões e impropérios e demorou uma barbaridade para sair do gramado por exigir um tradutor em campo, a fim de entender o porquê de sua expulsão. 

Na saída do gramado, o jogador ainda zombou da bandeira inglesa no escanteio e sentou no tapete vermelho exclusivo da Rainha. A partir dali, os ingleses sempre trataram os argentinos como “animais” e “selvagens”, com a recíproca de “racistas” e “ladrões” dos argentinos. Na Copa de 1986, as seleções chegavam às quartas de final em situações opostas. A Argentina vinha de boas partidas e sem sustos na primeira fase com vitórias sobre Coreia do Sul (3x1) e Bulgária (2x0) e empate em (1x1) contra a então campeã Itália. Nas oitavas de final, os alvicelestes bateram o rival Uruguai por (1x0) e se garantiram entre os oito melhores do Mundial.



Os capitães Maradona e Shilton.

Já a Inglaterra começou com o pé esquerdo ao ser derrotada por 1 a 0 para Portugal e empatar sem gols contra o Marrocos. Só na última e decisiva partida da fase de grupos que os ingleses conheceram o sabor da vitória graças ao talento de Gary Lineker, que marcou os três gols do triunfo sobre a Polônia por (3x0). Nas oitavas de final, Lineker foi mais uma vez decisivo e marcou dois gols na vitória por (3x0) sobre o Paraguai. Com o choque confirmado entre argentinos e ingleses, a comissão organizadora da Copa e o governo mexicano trataram de reforçar a segurança do estádio Azteca antes, durante e depois do jogo. Dezenas de militares foram escalados para garantir a proteção dos mais de 110 mil torcedores dentro e fora do estádio. O duelo dominava as manchetes dos jornais argentinos e britânicos há uma semana e a gana pela vitória era maior, claro, do lado sul-americano, afinal, o jogo era o primeiro contra os ingleses desde a fatídica guerra e os nacionalistas viam como oportunidade única a revanche diante dos europeus. Por tudo isso, é de se imaginar o estado de espírito que a Argentina entrou em campo. Principalmente o craque do time: Maradona.



Já no 1º Tempo Maradona mostra que
 é ele quem manda em campo nas bolas paradas.

Com os times perfilados em campo para a execução dos hinos, era visível a concentração do camisa 10 e seu olhar de repulsa aos ingleses. O baixinho levava consigo a necessidade e o fervor de derrotar aqueles “branquelos” e continuar seu projeto de ser campeão do mundo e mostrar de uma vez por todas que ele era o melhor jogador do planeta na época. Só uma atuação de gala e uma vitória poderiam ajudar Maradona em tudo aquilo. E ele estava mais do que pronto para a partida de sua vida.



Para impedir Maradona de avançar em direção ao gol, só com falta.

Embora o clima fosse de tensão e também de beleza pelo público contagiante no ensolarado Azteca, os jogadores começaram a partida sem faltas ríspidas ou provocações, com a Argentina mantendo a posse de bola e dominando as ações iniciais. Maradona iniciou suas jogadas de efeito e velocidade aos nove minutos, quando passou por dois marcadores e só não passou pelo terceiro, Fenwick, porque este fez falta e foi advertido com um cartão amarelo logo de cara. Nos minutos seguintes, Beardsley teve duas chances para marcar, mas Pumpido se saiu bem em ambas. Aos poucos, o craque e capitão argentino mostrava seu talento fora de série ao construir jogadas mesmo sendo marcado sempre por dois ingleses. Rápido, esguio e no auge da forma, Maradona era um virtuose com a bola nos pés e só era impedido de alcançar seus objetivos com faltas, que começaram a pipocar perto da área inglesa. E foi em uma cobrança de falta que o camisa 10 quase abriu o placar, mas a bola passou rente a trave esquerda de Shilton. 

Sedento pelo gol e pelo protagonismo da partida, Maradona ainda chamou a atenção de todos por causa de um desentendimento com o bandeirinha em uma cobrança de escanteio, aos 34´. Antes de partir para o chute, o argentino tirou a bandeirinha do buraco e foi repreendido pelo bandeira costarriquenho. Maradona foi obrigado a colocar o mastro no lugar e o fez. No entanto, faltava a flâmula, que continuava caída no chão. Após nova bronca, o camisa 10 pegou o pano e o colocou do jeito que deu no mastro. Resolvido o “problema”, o jogo seguiu, a tal cobrança não levou perigo aos ingleses e o primeiro tempo terminou mesmo sem gols. Mas ainda restavam 45 minutos.



Segundo tempo – A mão e a obra-prima. Contra imagens não há argumentos: la mano en su trabajo.

Se durante 45 minutos a Argentina não conseguiu balançar as redes inglesas, foram necessários apenas dez minutos para que o placar do estádio Azteca mostrasse 2 a 0 para os alvicelestes. Mas os números eram apenas simbólicos pelo que o público – e o mundo – tinha acabado de ver. Aos seis minutos, Maradona recebeu na esquerda, passou pelo primeiro, se enfiou no meio de dois e deixou na entrada da área para Valdano. O atacante tentou a devolução, mas o inglês Fenwick interceptou e chutou a bola para o alto. No entanto, a redonda foi ao encontro do goleiro Shilton, grandalhão, que viu a chegada de Maradona. 

Com, 1,83m, o camisa 1 nem pulou muito diante dos 1,65m de Maradona. Mas o argentino usou de um artifício bem peculiar para empurrar a bola para dentro do gol: o punho fechado e forte que socou a bola de uma maneira única que não deixou o árbitro tunisiano Ali Bennaceur, quatro metros fora da área, perceber o truque. Maradona saiu comemorando timidamente e de olho no juiz. 



O delírio de Maradona e o nada amigável público inglês ao fundo.

Ele percebeu que ninguém de seu time veio ao seu encontro e chamou os colegas: “Vamos, me abracem, ou o árbitro não vai validar o gol!”. De nada adiantou a reclamação dos ingleses. Nem os berros e pulos de Shilton. Era gol. O gol com um pouco da cabeça de Maradona e outro pouco com “La mano de Dios”, como ficou amplamente conhecido aquele tento argentino. Indo de volta para seu campo, o camisa 10 erguia com orgulho a mão fechada que havia acabado de fazer história.



Maradona arranca...

Os ânimos ingleses ficaram mais exaltados após o polêmico gol e a partida tinha tudo para ficar emocionante. Mas Maradona não iria deixar os ingleses gostarem do jogo ou marcar um gol de empate. Ele precisava marcar mais um para não deixar dúvidas naquele público que olhava para ele meio ressabiado como quem diz “pô, de mão até eu faço!”. Com pouco mais de nove minutos do segundo tempo, o camisa 10 iniciou o lance que não teria ajudinha divina alguma. 



Dribla meio time da Inglaterra...

Apenas o talento e genialidade do baixinho. Ainda uns cinco metros dentro do campo argentino, Maradona deu um rápido giro de corpo e se livrou de uma só vez de Reid e Beardsley. Com um ligeiro toque, a bola correu e Maradona foi atrás como um foguete em direção à área inglesa. No meio do caminho, Butcher foi despistado com facilidade, Fenwick ficou para trás com um corte cruel e o argentino chegou à área inglesa. Nela, Shilton foi driblado, Fenwick ainda tentou um carrinho, mas Maradona tocou para o gol antes de ser derrubado. 



E faz aquele que seria o Gol Antológico de todas as Copas...

Gol. Golaço. Obra de arte. Fascínio puro pela arte.  Em apenas 10 segundos, Maradona percorreu 60 metros e construiu seu mais belo e estupendo gol. Mas os 10 segundos pareceram bem menos de tão exuberante que foi a jogada. O relógio deveria parar. O público deveria pagar ingresso novamente. Os ingleses deveriam aplaudir. Era o gol da Copa. E das Copas. Ninguém, sozinho, jamais havia feito semelhante beleza. Nem Pelé. Nem Gerd Müller. Nem Cruyff. Nem Garrincha. O gol do século das Copas era de Diego Armando Maradona.





O fato é que a batalha futebolística de 22 de junho de 1986 foi vencida pelos sul-americanos, que fizeram justiça com os próprios pés, uma mão divina e um Dios dentro de campo: Maradona, eterno como aquele jogo.

Com (2x0) no placar, a Argentina passou a jogar com mais precaução na defesa e a Inglaterra dominou as ações ofensivas. Na base do chuveirinho, bolas e mais bolas eram alçadas na área portenha, mas Pumpido ou os zagueiros sempre cortavam. Hoddle cobrou uma falta perigosa que exigiu ótima defesa do goleiro argentino. Aos 31´, o técnico Bobby Robson colocou a Inglaterra totalmente no ataque ao trocar Steven pelo jovem e habilidoso Barnes. 

O ponta rapidamente mostrou a que veio e, aos 36´, fez uma boa jogada pela esquerda e cruzou na medida para Lineker diminuir a desvantagem e anotar seu sexto gol na Copa, além de aparecer pela primeira vez no jogo depois de ser marcado de maneira implacável e impecável pela zaga argentina. Faltavam quase dez minutos para o fim do jogo e era hora do tudo ou nada. Logo na saída de bola, Maradona tratou de aparecer de novo ao entortar mais alguns ingleses com seus toques rápidos e deixar Tapia com uma ótima oportunidade para marcar. No chute, o atacante acertou a trave direita de Shilton e por pouco não ampliou para (3x1). 

No finalzinho, Barnes, sempre pela esquerda, tentou repetir a jogada do primeiro gol e cruzou na medida para Lineker, que só não marcou o gol de empate porque Brown cortou milésimos de segundos antes da chegada do camisa 10 inglês. Aquela seria a última chance inglesa. Com o apito final do árbitro, a Argentina estava classificada. E vingada, na bola, do desastre bélico de quatro anos atrás. Em entrevista ao The Guardian, em 2002, o célebre jogador argentino Roberto Perfumo definiu bem a razão de vencer a Inglaterra para os argentinos:

“Em 1986, vencer aquele jogo contra a Inglaterra era o suficiente. Vencer a Copa do Mundo era secundário para nós. Bater a Inglaterra era nosso verdadeiro objetivo”. – Roberto Perfumo, em entrevista ao The Guardian, maio de 2002."

(Fontes do Site Imortais do Futebol)


sábado, 12 de abril de 2014

Jogos Eternos – Brasil 2x3 Itália 1982


Jogo Histórico da Copa do Mundo de 1982 entre as Seleções de Itália e Brasil



Perfilados e prontos para o show: o Brasil de 1982 era pura música. Em pé: Waldir Peres, Leandro, Oscar, Falcão, Luisinho e Júnior. Agachados: Sócrates, Cerezo, Serginho, Zico e Éder.

Brasil e Itália chegaram ao duelo do dia 05 de julho de 1982 em situações muito, mas muito opostas. Do lado brasileiro, o clima era de festa, confiança extrema e créditos de sobra após uma campanha impecável na primeira fase – vitórias sobre URSS (2x1), Escócia (4x1) e Nova Zelândia (4x0) – e um acapachante triunfo por (3x1) sobre a Argentina, este já na segunda fase. Em todas as vitórias brasileiras, o público espanhol se encantou com o futebol cheio de classe, vigor, toques inteligentes e gols magníficos do esquadrão montado por Telê Santana. Era a mais bela Seleção Brasileira como há anos não se via, mais precisamente desde o timaço de Pelé e companhia que ganhou o tricampeonato mundial, em 1970. Já a Itália juntava os cacos de seu futebol após o escândalo do Totonero, que deflagrou uma grande máfia de manipulação de resultados que puniu clubes, dirigentes e jogadores, incluindo Paolo Rossi, que ficou dois anos sem jogar. Mesmo com vários bons jogadores, o técnico Enzo Bearzot sofreu com a marcação cerrada da imprensa e com a falta de ânimo do elenco, que empatou os três jogos da primeira fase (0x0) com a Polônia, (1x1) com o Peru e (1x1) com Camarões) e só se classificou para a etapa seguinte por causa do saldo de gols. Nem a vitória por (2x1) sobre a Argentina, com uma atuação muito melhor do que na primeira fase, serviu para amenizar as críticas da torcida italiana, que tinha quase certeza na derrota para o poderoso e “imbatível” Brasil.

Naquela segunda fase, os campeões de cada um dos quatro grupos fariam as semifinais. Ao Brasil, bastava um empate. À Itália, só a vitória interessava. Antes do duelo, praticamente ninguém apostava nos europeus tamanha diferença técnica entre os adversários. A Itália jogava um futebol sem graça, sem brilho e sem ação. O Brasil jogava um futebol cheio de graça, cheio de brilho, com muita ação e muitos gols. O palco da partida seria o Estádio Sarriá, em Barcelona, cidade do famoso clube homônimo conhecido por sempre praticar um futebol vistoso e jantar seus oponentes no Camp Nou, palco que deveria, por méritos, abrigar uma partida tão importante e tão cheia de história.



Gentile grudado em Zico: a síntese da marcação italiana naquela tarde.

Quando entrou em campo, o time do Brasil parecia já ter consigo a vitória. Os jogadores tinham confiança plena em si e sabiam que os gols sairiam com naturalidade e na hora que eles bem entendessem. Mas foi só a bola rolar para todo aquele pensamento e toda aquela aura mística construída ao redor do esquadrão verde e amarelo esmaecer. 

Pela primeira vez na Copa, o time de Telê Santana enfrentava um adversário que marcava homem a homem, sem deixar espaços nem chances para os pensantes brasileiros arquitetarem suas obras de arte. Oriali grudava em Éder. Colovati mirava Serginho. Cabrini vigiava Sócrates. Gentile era a sombra de Zico. Conti não saía de perto do companheiro de Roma, Falcão. Graziani atrapalhava as investidas de Leandro. Antognoni recuava para infernizar Cerezo. Só Rossi não tinha função. Ou melhor, tinha sim: marcar gols. Aquele era o jogo para o “bambino de ouro” afastar de vez a urucubaca e classificar a Itália para a semifinal. No entanto, ninguém dava bola para ele. Nem o público, muito menos os zagueiros brasileiros. E esse desprezo seria duramente penalizado.

Com apenas cinco minutos, a Itália mostrou a todos o primeiro ponto fraco do time sul-americano: a bola aérea. O lateral Cabrini, com liberdade e sem o incômodo de Leandro, recebeu livre após boa inversão de jogo e viu Rossi na área. O cruzamento foi certeiro, bem como a cabeçada do camisa 20, que apareceu entre Luisinho e Júnior e mandou para as redes de Waldir Peres: (1x0). Enfim, Rossi havia marcado seu primeiro gol na Copa. E, pela terceira vez no Mundial, o Brasil saía atrás no marcador. O gol italiano não assustou ninguém, afinal, o timaço de Telê sempre vencia e sempre virava. Minutos depois, Zico encontrou um espaço diante da marcação cerrada de Gentile, roubou uma bola na entrada da área e deu de bandeja para Serginho. O centroavante brasileiro tinha o gol escancarado à sua frente, mas o chute do camisa 9 foi bisonho, grotesco, horrível, repugnante! A bola saiu pela linha de fundo e a nação brasileira lamentou profundamente a ausência de Careca. 

O Brasil era só ataque, e a Itália era só marcação, jogando de maneira plena e com uma aplicação tática fora do comum. Mas, aos 12´, a genialidade de Zico superou qualquer recomendação do técnico Enzo Bearzot ou qualquer puxada de camisa de Gentile. Após receber de Falcão, o camisa 10, num lapso de segundo, driblou seu marcador e tocou fantasticamente para Sócrates, que vinha na corrida pela direita. O Doutor chutou entre a trave e Dino Zoff e marcou um golaço: (1x1). Festa no Sarriá! E alívio no Brasil.



Sócrates finaliza uma jogada maravilhosa: golaço do Brasil.


Ainda confiantes, os brasileiros seguiram no ataque e tinham tanta calma que nem sequer pediram pênalti após Gentile puxar a camisa de Zico dentro da área. Parecia que os sul-americanos não queriam matar o jogo logo. Eles queriam dar show. Mas a Itália precisava vencer. Era preciso tomar a bola daqueles brasileiros a qualquer custo. À espreita, cada italiano aguardava um único vacilo para contra-atacar. E ele aconteceu. Aos 25´, Toninho Cerezo estava no meio de campo, com a bola dominada, e só precisava efetuar um passe simples para que uma possível jogada de ataque fosse construída. Mas Cerezo errou. Devaneou. Deve ter pensado na fase seguinte, na final, no título. Se esqueceu que ainda tinha a Itália. E Paolo Rossi. O atacante recebeu o passe de Cerezo, saiu em disparada como um foguete e fuzilou Waldir Peres: (2x1). A Itália estava novamente na frente. E Cerezo ameaçou chorar. Júnior percebeu, foi até ele e disse: “se não parar de chorar, meto-lhe a mão na cara. Esse é um jogo para homens, Toninho. Se você está com medo, saia logo”.



Rossi e a bola: perigo constante para o Brasil.

Não era apenas Cerezo que tinha medo. O torcedor brasileiro, bem como o espanhol, começava a temer pelo pior. O Brasil não encaixava seu jogo de antes. E a Itália jogava como jamais havia jogado antes. O tempo passou e os gols não saíram por causa da zaga italiana, impecável e um verdadeiro muro, com o líbero Scirea capitaneando as ações como quem comandava um imponente e azzurro transatlântico. Após o apito do árbitro israelense Abraham Klein, os brasileiros foram para os vestiários precisando de mais um gol. Haveria mais emoção. E como.


Falcão chuta para empatar e dar esperanças para o Brasil.

Com apenas 45 minutos para reverter sua situação, o Brasil começou com tudo o segundo tempo e se mandou para o ataque logo de cara. A Itália apostava na tática da primeira etapa e se resguardava em seu campo de defesa, só esperando o momento certo para dar o bote. Só dava Brasil e, nos poucos lances em que a Itália conseguia ter a bola consigo, era sempre pelo lado esquerdo, com Cabrini, aproveitando a ausência de um ponta-direita no Brasil. Falcão, num chute que raspou a trave, Serginho e Leandro tentavam, mas a falta de pontaria e Dino Zoff evitavam o empate canarinho. Os italianos também arriscavam com Conti e Rossi, mas a bola teimava em não entrar. Mas, aos 27´, mais um golaço brasileiro colocou fogo no jogo e reascendeu os ânimos dos amantes do futebol arte. Júnior, ao seu estilo, deixou a lateral-esquerda e foi avançando pela diagonal em direção à área. O craque tocou para Falcão, que podia deixar com Cerezo, na direita. Mas o Rei de Roma percebeu que a marcação italiana estava se afastando e decidiu mandar um petardo que destruiria tranquilamente a outra metade do Coliseu: (2x2). E que golaço! 



Falcão extravasa após marcar golaço...


Na comemoração, Falcão berrou, vibrou e mostrou para todo mundo suas veias saltadas com o sangue da emoção, o Puro Sangue que tanto os torcedores do Internacional conheciam. Era o retrato pleno da alegria que o Brasil sentia naquele momento. A semifinal estava perto. O futebol arte estava vencendo!



Jogadores da Azurra abraçam Paolo Rossi, em tarde iluminada do atacante que marcou 3 vezes e eliminou o Brasil.

Depois do gol, Telê Santana tirou Serginho e colocou Paulo Isidoro não para manter o placar, mas para marcar mais gols. Não era da filosofia do técnico retrancar sua equipe. Seria um sacrilégio mandar Falcão, Zico, Éder e Sócrates ficarem atrás da linha do meio de campo sem avançar um centímetro sequer. Mas ali nasceu o entusiasmo italiano e o caminho para tentar mais um gol. Aquele Brasil sabia atacar, mas não sabia se defender. Embora os sul-americanos continuassem atacando e buscando o terceiro gol, a Itália, nas poucas vezes em que ia para o ataque, causava problemas na zaga brasileira. Perto dos trinta minutos, a Azzurra buscava um gol na jogada aérea e a bola foi desviada para escanteio. Na cobrança, os brasileiros se amontoaram na grande área e, ao invés de cada um pegar um, vários italianos ficaram sozinhos. Incluindo um camisa 20. A bola viajou, Tardelli tentou o chute, a bola foi desviada e Paolo Rossi, livre, marcou: (3x2). Ninguém entendeu nada. Os brasileiros, atônitos, olhavam para o árbitro e para o bandeirinha como quem diz “ele não estava impedido? De onde ele veio?”. Rossi saiu correndo em puro êxtase com o que tinha acabado de fazer: três gols em cima do Brasil.



A lamentação de Sócrates e Éder após o apito final.

Faltavam quinze minutos. O Brasil precisava de apenas mais um gol. Mas o terceiro gol italiano foi de exaurir as energias. De rabiscar as táticas. De esfriar todo e qualquer ânimo. Os entusiasmados espanhóis percebiam que aquele Brasil poderia, sim, ser eliminado. E que a Itália, incrivelmente, poderia se classificar. Com 25 chutes a gol na partida, o Brasil deu apenas um nos quatorze minutos seguintes ao gol fatídico de Rossi. Já a Itália ainda marcou o quarto, com Antognoni, após boa jogada de Rossi, mas o bandeirinha anulou o tento por impedimento. Aos 44´, Éder cobrou uma falta da esquerda na cabeça do zagueiro Oscar. Ele cabeceou firme, em direção ao chão, mas Dino Zoff fez uma defesa espetacular, segurando a bola quase em cima da linha. Muitos acharam que foi gol, mas o veterano capitão italiano, com a bola em seus braços, calou qualquer contestação adversária. Mais alguns segundos e pronto. Era o fim de jogo. A Itália, tão contestada, tão execrada e tão ignorada, estava classificada. E o Brasil, tão elogiado, tão maravilhado e tão endeusado, estava eliminado.



Paolo Rossi impediu naquela tarde no Sarriá, que o Futebol Arte da Seleção Brasileira sucumbisse ao pragmático  futebol da Azurra... Coisas do Futebol.

Para os amantes do futebol arte, a derrota dos sul-americanos era uma verdadeira tragédia, algo inimaginável. Assim como a Hungria, em 1954, e a Holanda, em 1974, mais uma grande seleção ficava pelo caminho e não faturava a Copa do Mundo. Pior do que isso, a derrota brasileira foi também a morte do “Joga Bonito” e da magia no futebol verde e amarelo. Os três gols de Paolo Rossi mataram os últimos vestígios de beleza que o Brasil tinha. Dali em diante, a equipe brasileira só jogaria um futebol simples, normal, “terráqueo” e com poucos lances dignos dos deuses. Mais duas Copas seriam ganhas, em 1994 e em 2002, mas nenhuma com a plasticidade e a exuberância dos times de 1958, 1962, 1970 e 1982. A comoção foi tão grande que a Espanha inteira decretou que a Copa “havia terminado” com a eliminação brasileira, a ponto de um jornal de Sevilha estampar em sua capa: “Por favor, voltem logo. Será difícil que nos acostumemos a outro tipo de futebol”. Anos depois, até o palco daquela fatídica partida, o Estádio Sarriá, não continuou em pé e parou de alimentar lembranças tão dolorosas. Ele virou pó e entulhos em apenas três segundos e deu lugar a um grande condomínio residencial.

(Fontes do Site Imortais do Futebol)